Boas Práticas na Utilização do Jusbrasil Soluções
Publicado em 14/05/2025
1. Introdução e uso dos dados com responsabilidade
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Para além dos parâmetros contratuais, é importante que cada entidade que utilize algum produto de Jusbrasil Soluções adote boas práticas nos usos dos dados. Apesar da maior parte dos produtos trabalharem com dados públicos, atualmente há algumas diretrizes que devem ser seguidas nesse tratamento para que ele continue sendo lícito e responsável. Como sabemos que é um assunto complexo, esse guia foi elaborado com base nas melhores práticas nacionais e internacionais, indicando alguns parâmetros e recomendações que devem ser adaptadas pelos clientes do Jusbrasil Soluções, a depender de seu contexto.
A definição de tais parâmetros levou em consideração normas setoriais, decisões judiciais (sendo que alguns julgamentos ainda estão em curso) e decisões de autoridades nacionais de proteção de dados de autoridades estrangeiras¹.
A partir do momento em que o dado é disponibilizado aos clientes, o Jusbrasil Soluções não se responsabiliza por qualquer ação do cliente, inclusive aquelas que possam estar em descompasso com o previsto no nesse guia. Quaisquer responsabilidades em decorrência do uso em descompasso ou de maneira diferente daquilo que é previsto no contrato é de responsabilidade integral do cliente.
Por essa razão, esse guia irá passar sobre alguns dos principais pontos de preocupação que qualquer organização pode ter ao tratar de dados pessoais que também são dados disponíveis publicamente. Mais uma vez, ressaltamos que cada organização deve levar em consideração o seu próprio contexto, e adaptar esse essas sugestões a sua realidade.
¹ Por que olhamos para autoridades estrangeiras? No Brasil, temos a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) que é a responsável por regulamentar aspectos deixados em aberto pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Como a LGPD é muito baseada na Regulamentação Geral de Proteção de Dados, da União Europeia (UE), a ANPD tem utilizado muitos documentos de autoridades nacionais europeias como base para algumas de suas decisões.
2. Resumo dos tópicos a serem abordados
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Tópicos para boas práticas e parâmetros de uso
Qual é a origem dos dados?
Qual a finalidade da análise?
Quais tipos de dados são pertinentes para a análise? (Por ex. saber se a pessoa possui processos relativos a relações de consumo é relevante?)
Algumas orientações para finalidades específicas
Medidas de transparência
Medidas de adequação à LGPD
3. Origem dos dados
—
TLDR: Uma operação que se utilize de dados cuja origem é ilícita, por mais que também utilize outras fontes lícitas, correrá o risco de realizar atividades fora dos parâmetros da lei.
Começamos por uma avaliação que deve ser feita primordialmente, antes da integração de qualquer base de dados a um sistema, que é sobre a origem daqueles dados. Deve haver cuidado na escolha dos dados em relação a sua origem, de maneira a garantir, desde o princípio do tratamento, sua licitude. Por exemplo, nos últimos anos, houve inúmeros vazamentos ilegais de diversas bases de dados, que foram apropriadas por entidades e organizações diversas. A compra/obtenção desses dados é considerada ilícita.
Quando falamos de dados disponíveis publicamente de maneira legítima, também deve haver cuidados. Por exemplo, informações em segredo de justiça são consideradas sigilosas pela própria Constituição Federal e normas infralegais, de forma que sua utilização, em princípio, por partes não interessadas e pessoas não autorizadas pode ser objeto de reparação judicial. Por essa razão, há um cuidado muito grande nos dados que estão disponíveis no Jusbrasil Soluções e, em alguns casos, não há a possibilidade de disponibilização de certos tipos de informações e bases de dados.
Ainda, apesar da licitude dos dados disponibilizados no Jusbrasil Soluções, se eles forem combinados com dados obtidos de maneira ilícita ou ilegítima pela contratante posteriormente, isso pode implicar em uma ilicitude do tratamento, tanto do ponto de vista da Lei Geral de Proteção de Dados ("LGPD", Lei n. 13709/2018) quanto de outras normas.
Após a verificação de que a origem dos dados é legítima e que sua fonte é lícita, passa-se a analisar outros aspectos para determinar a licitude da atividade de checagem de antecedentes.
4. Finalidade de uso dos dados
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O segundo passo para saber se a atividade é lícita e/ou de alto risco ou não, é a análise da finalidade para qual aquele dado será utilizado.
Por exemplo, determinadas finalidades de uso, como aquelas em relação a recrutamento, seleção ou realizar checagem em pessoas já contratadas, possuem limitações indicadas em normas e jurisprudência. Para outras finalidades, não necessariamente essas limitações se aplicarão. Por isso, é muito importante que, antes de realizar a consulta processual, já se tenha ciência mínima dos casos de uso nas quais elas se aplicarão. É fundamental que se saiba responder quais os propósitos específicos que irão nortear o tratamento.
Quando se determina a finalidade é mais fácil identificar se esta é vedada ou não pela jurisprudência e pela legislação. Quanto mais específica é a finalidade, mais fácil é a identificação de sua licitude ou não. Por exemplo: consulta processual para recrutamento de trabalhadores que trabalham com substâncias tóxicas - esse caso é expressamente autorizado pela jurisprudência (IRR 01 do TST).
5. Dados pertinentes para a análise
—
Ou seja: Sempre será necessário avaliar o contexto que enseja a necessidade da análise de dados processuais e ligá-lo com o caso específico.
Um dos princípios mais importantes da LGPD é o da necessidade (LGPD, art. 6o, III), pelo qual deve-se utilizar apenas os dados que serão estritamente necessários para aquele tratamento como forma de alcançar sua finalidade. Por isso, deve-se considerar os dados pertinentes à atividade, que são proporcionais e não excessivos para atingir os objetivos da consulta.
Em outras palavras, antes de realizar a análise, deve-se entender, minimamente, qual espectro/escopo dos dados seriam pertinentes para ela. Por ex, no caso de dados processuais, para determinadas análises, seria realmente pertinente receber dados referentes a processos de direito ao consumidor? Ou essa medida poderia ser excessiva e não proporcional?
Ainda, conforme indicamos anteriormente, finalidades e situações específicas demandam diferentes análises e desenhos de consulta. Pode ser que, em um contexto, utilizar informações relacionadas a processos civis seja aceitável.
Por exemplo, há casos em que a lei determina que sejam feitas certas pesquisas de antecedentes para alguns cargos, como a Lei 14.811/24, que fala especificamente da necessidade de manutenção de documentação com antecedentes criminais para alguns profissionais em instituições de ensino que irão lidar com menores de idade. Em outro caso, temos a previsão explícita da restrição de uso de certos dados. Por exemplo,, no julgamento do caso do Recurso Ordinário no Processo do Trabalho n. 0000241-06.2013.5.04.0802, determinou-se que, em atividades de contratação de motoristas de carga, é considerado discriminatório a pesquisa, utilização, armazenamento ou mesmo o repasse de informações negativas sobre motoristas baseadas em cadastros de crédito, cadastros referentes a processos civis, inquéritos policiais e processos criminais sem sentença transitada em julgado.
6. Algumas orientações para finalidades específicas
—
Consulta para atividades de recrutamento
TLDR: A justiça já determinou que é discriminatória e abusiva a conduta de fazer análise de histórico processual e checagem de maneira genérica. Em outras palavras, pela justiça, é potencialmente infringente a prática de fazer checagem para qualquer caso de contratação, sem uma análise prévia. Por exemplo, é potencialmente ilegal a prática de fazer checagem de um departamento inteiro de uma empresa, a não ser que haja fortes motivos para tal (ex. o departamento todo lida com transações financeiras sensíveis). Dessa forma, deve-se entender bem qual o público alvo e elencar motivos que justifiquem tal ação. Assim, deve-se entender quais os casos específicos que são permitidos pelas normas (ex. avaliar posições de confiança e pessoas lidem com bens de alto valor). Além disso, sempre vale checar se
Neste tópico, falaremos brevemente de entendimentos consolidados sobre atividades de recrutamento.
Mais especificamente, é importante:
Verificar se a checagem é uma hipótese autorizada pela legislação e jurisprudência
Verificar se os dados a serem analisados são pertinentes para o tipo de avaliação que será realizada, em concordância com o princípio da necessidade da LGPD.
Por exemplo, por vezes, uma pessoa pode ter processos relativos a direito do consumidor. Tais dados geralmente não são pertinentes para uma análise relativa a uma pessoa que ocupa ou potencialmente ocupará posição de confiança em uma empresa. A LGPD estabelece, através do princípio da necessidade, que dados que não são necessários para a análise devem ser descartados. Por essa razão, é importante que a empresa tenha pelo menos algumas diretrizes relativas aos dados que são pertinentes para cada uma de suas análises - sempre levando em consideração o caso concreto.
Além de ser contrário ao princípio da necessidade previsto na LGPD, a análise de dados não pertinentes para uma avaliação pode atrasar esse processo e oferecer resultados que não sejam tão úteis para o avaliador.
Entender quais são as hipóteses autorizativas da LGPD que autorizam o tratamento, independente de se tratarem de dados públicos ou não.
Realizar uma análise de risco relativa do ponto de vista de enquadramento à LGPD e entender se há necessidade de documentos adicionais, como teste de legítimo interesse, dentre outros.
Informar ao candidato e/ou funcionário que, eventualmente, poderá consultar outras fontes informacionais sobre ele que estejam relacionadas ao exercício de sua função
O que a lei não recomenda realizar (tanto para processos seletivos quanto para avaliação de funcionários já contratados)
Realizar a busca de processos trabalhistas, visto que configura a montagem de lista suja
ex. Verificar se a pessoa já processou outra empresa onde trabalhou.
Realizar busca de processos criminais de maneira generalizada e sem nenhuma ressalva/limites para qualquer tipo de posição:
Conforme colocamos anteriormente, não é recomendado que se faça busca de informações criminais de maneira generalizadas para funcionários no geral. Isso significa que cada vaga/função vai demandar uma justificativa diferente para a realização ou não de consulta processual.
Ter como base da análise processos em andamentos/boletins de ocorrência. Isso é proibido expressamente pela decisão do TST.
Consulta de Antecedentes Criminais
No caso da checagem de antecedentes realizada para fins de recrutamento, o principal parâmetro que temos atualmente consiste no julgamento do Incidente de Recurso Repetitivo de Tema nº 01 (ou processo nº 243000-58.2013.5.13.0023) pelo Tribunal Superior do Trabalho ("TST"). Nessa decisão, o TST avaliou a possibilidade de o empregador solicitar certidão de antecedentes criminais durante o processo seletivo e decidiu que essa exigência seria justificada apenas em situações excepcionais, como: (i) quando a lei prevê; (ii) pela natureza do ofício; e/ou (iii) grau de fidúcia da atividade a ser desenvolvida.
Assim, deve-se entender se as funções a serem analisadas possuem algum desses elementos e como eles se relacionam, de maneira a justificar a pertinência da realização desse tipo de operação.
Em decisão mais recente (RRAg - 318-54.2013.5.04.0013), o TST entendeu que, mesmo que sejam fornecidas somente informações de processos criminais, é preciso exibir somente aqueles que poderiam impactar a atividade a ser prestada. Fornecer outras informações, inclusive relacionadas a outros tipos de processos judiciais, configura conduta discriminatória que restringe o acesso ao mercado de trabalho.
Trazemos abaixo alguns exemplos de funções nas quais há certa passividade sobre a possibilidade de realização busca de antecedentes criminais:
Empregados domésticos;
Cuidadores de menores, idosos ou deficientes;
Motoristas rodoviários de carga;
Empregados que laboram no setor da agroindústria no manejo de ferramentas de trabalho perfurocortantes; Bancários e afins;
Trabalhadores que atuam com substâncias tóxicas, entorpecentes
e armas;Trabalhadores que atuam com informações sigilosas;
Pessoas em cargo de confiança e que lidarão com alto risco;
Pessoas que tenham que ter porte de armas.
Pessoas que trabalham com menores de idade em instituições de ensino (Lei 14.811/24)
Outros casos:
Serviços financeiros digitais: Lei da Lavagem de Dinheiro (nº 9.613/98), que determina as organizações reguladas a identificarem seus clientes e manterem esse cadastro sempre atualizado, assim como o registro de todas as transações realizadas em moeda nacional ou estrangeira. Dessa forma, funções que estejam implicadas na legislação podem
ser afetadas.Serviços de delivery: motoboys e mototaxistas, por exemplo, são regulamentados pela Lei nº 12.009/09, que exige que pessoas nessa função tenham 21 anos completos. Além disso, o artigo 147 do Código de Trânsito Brasileiro determina que os candidatos devem aplicar aos exames oferecidos pelo órgão executivo de trânsito brasileiro.
Exemplos de leis que permitem checagem
Abaixo, trazemos abaixo alguns exemplos de legislações que permitem a realização de certos tipos de checagem. A lista não é exaustiva. É interessante, antes de utilizar dados públicos, entender se há legislações específicas que exigem e/ou encorajam determinados tipos de estudo.
Lei nº 14.811/24: Muda a redação do ECA para que determinar a manutenção de certidões criminais para seus colaboradores, especialmente aqueles que lidam com menores de idade.
Instituições sociais públicas ou privadas (com recursos públicos): Devem exigir e atualizar certidões a cada 6 meses.
Estabelecimentos educacionais (públicos ou privados): Devem manter fichas cadastrais e certidões atualizadas, independentemente de receberem recursos públicos.
Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97): O art. 329 determina a checagem de antecedentes criminais de motoristas de veículos de aluguel e escolares. Os condutores, para exercerem suas atividades, deverão apresentar, previamente, certidão negativa do registro de distribuição criminal relativamente aos crimes de homicídio, roubo, estupro e corrupção de menores, renovável a cada cinco anos, junto ao órgão responsável pela respectiva concessão ou autorização
Lei nº 14.967/24: Determina a verificação de antecedentes criminais de vigilantes e prestadores de serviço de segurança privada, assim como antecedentes civis e criminais para responsáveis pela prestação de serviço de segurança privada.
Lei nº 12.009/09: determina a verificação de antecedentes criminais de motoboys e mototaxistas.
Lei nº 12.587/12: determina a verificação de antecedentes criminais de motoristas de aplicativo.
7. Por que esse cuidado?
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O Jusbrasil Soluções não se responsabiliza pela realização da análise concreta de cada caso sobre a necessidade de consulta processual na tomada de decisão do cliente. No entanto, há decisões que implicam todos os agentes na cadeia de tratamento por responsabilidade em caso de tratamento indevido. pelo fornecimento de dados para a pesquisa também estaria incorrendo em uma infração.
Por essa razão, o Jusbrasil Soluções oferece informações e contextualização sobre os casos que necessitam de mitigação.
De modo geral, o entendimento que temos é de que a checagem de antecedentes durante processo seletivo só é legítima e compatível com a legislação quando sua finalidade estiver relacionada a obrigação legal (ex: contratação de motoboys²), ao tipo de trabalho a ser executado ou a um elevado grau de cuidado a ser considerado na contratação (ex: motoristas de cargas).
Lembramos ainda que, a depender do contexto e da forma que é realizada, a checagem de antecedentes pode consistir em conduta discriminatória.
Lei nº 9.029/1995 (art. 1º): estabelece que são vedadas práticas discriminatórias e limitativas ao acesso ao trabalho que sejam baseadas em sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros.
Lei nº 9.799/1999: altera o art. 373A da CLT para que conste a vedação à consideração de sexo, idade, cor ou situação familiar como variável determinante para fins de remuneração, formação profissional e oportunidades de ascensão profissional, bem como à adoção de critérios subjetivos para deferimento de inscrição ou aprovação em concursos, em empresas privadas, em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez.
LGPD: evidencia a preocupação com a utilização de dados pessoais para fins discriminatórios ao estabelecer, em seu art. 6º, como um dos princípios que devem ser observados nas atividades de tratamento de dados pessoais a não discriminação, sendo afastada a possibilidade de realização do tratamento para fins discriminatórios ilícitos ou abusivos.
² No art. 2º da Lei nº 12.009/2009: estabelece que, para o exercício das profissões de motoboy e mototaxista, será necessário apresentar certidão negativa das varas criminais, além de outros documentos de identificação da pessoa e da motocicleta utilizada em serviço e de comprovação da habilitação para exercício da atividade.
8. Medidas de transparência
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É importante que os funcionários/candidatos/titulares de dados no geral estejam cientes pelo menos da possibilidade de realização de checagem de antecedentes. A forma e o momento em que isso é comunicado, assim como o teor da comunicação, é de responsabilidade da empresa e não do Jusbrasil Soluções.
9. Medidas de adequação à LGPD
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A empresa é responsável por determinar as finalidades e bases legais que justificam essa atividade. Ainda, a empresa precisa entender se há algum documento específico que precisa produzir (por ex. Relatório de Impacto) e realizá-lo. Nos contratos firmados entre as partes (Jusbrasil Soluções e empresas), há cláusulas nas quais os clientes se comprometem a garantir que estão adequados à LGPD e que tomam todas as medidas necessárias para a mitigação dos riscos.
Importante mencionar que, nos contratos, a contratada se compromete em estar adequada à LGPD e obedecer às suas determinações.
Publicado em 14/05/2025
1. Introdução e uso dos dados com responsabilidade
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Para além dos parâmetros contratuais, é importante que cada entidade que utilize algum produto de Jusbrasil Soluções adote boas práticas nos usos dos dados. Apesar da maior parte dos produtos trabalharem com dados públicos, atualmente há algumas diretrizes que devem ser seguidas nesse tratamento para que ele continue sendo lícito e responsável. Como sabemos que é um assunto complexo, esse guia foi elaborado com base nas melhores práticas nacionais e internacionais, indicando alguns parâmetros e recomendações que devem ser adaptadas pelos clientes do Jusbrasil Soluções, a depender de seu contexto.
A definição de tais parâmetros levou em consideração normas setoriais, decisões judiciais (sendo que alguns julgamentos ainda estão em curso) e decisões de autoridades nacionais de proteção de dados de autoridades estrangeiras¹.
A partir do momento em que o dado é disponibilizado aos clientes, o Jusbrasil Soluções não se responsabiliza por qualquer ação do cliente, inclusive aquelas que possam estar em descompasso com o previsto no nesse guia. Quaisquer responsabilidades em decorrência do uso em descompasso ou de maneira diferente daquilo que é previsto no contrato é de responsabilidade integral do cliente.
Por essa razão, esse guia irá passar sobre alguns dos principais pontos de preocupação que qualquer organização pode ter ao tratar de dados pessoais que também são dados disponíveis publicamente. Mais uma vez, ressaltamos que cada organização deve levar em consideração o seu próprio contexto, e adaptar esse essas sugestões a sua realidade.
¹ Por que olhamos para autoridades estrangeiras? No Brasil, temos a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) que é a responsável por regulamentar aspectos deixados em aberto pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Como a LGPD é muito baseada na Regulamentação Geral de Proteção de Dados, da União Europeia (UE), a ANPD tem utilizado muitos documentos de autoridades nacionais europeias como base para algumas de suas decisões.
2. Resumo dos tópicos a serem abordados
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Tópicos para boas práticas e parâmetros de uso
Qual é a origem dos dados?
Qual a finalidade da análise?
Quais tipos de dados são pertinentes para a análise? (Por ex. saber se a pessoa possui processos relativos a relações de consumo é relevante?)
Algumas orientações para finalidades específicas
Medidas de transparência
Medidas de adequação à LGPD
3. Origem dos dados
—
TLDR: Uma operação que se utilize de dados cuja origem é ilícita, por mais que também utilize outras fontes lícitas, correrá o risco de realizar atividades fora dos parâmetros da lei.
Começamos por uma avaliação que deve ser feita primordialmente, antes da integração de qualquer base de dados a um sistema, que é sobre a origem daqueles dados. Deve haver cuidado na escolha dos dados em relação a sua origem, de maneira a garantir, desde o princípio do tratamento, sua licitude. Por exemplo, nos últimos anos, houve inúmeros vazamentos ilegais de diversas bases de dados, que foram apropriadas por entidades e organizações diversas. A compra/obtenção desses dados é considerada ilícita.
Quando falamos de dados disponíveis publicamente de maneira legítima, também deve haver cuidados. Por exemplo, informações em segredo de justiça são consideradas sigilosas pela própria Constituição Federal e normas infralegais, de forma que sua utilização, em princípio, por partes não interessadas e pessoas não autorizadas pode ser objeto de reparação judicial. Por essa razão, há um cuidado muito grande nos dados que estão disponíveis no Jusbrasil Soluções e, em alguns casos, não há a possibilidade de disponibilização de certos tipos de informações e bases de dados.
Ainda, apesar da licitude dos dados disponibilizados no Jusbrasil Soluções, se eles forem combinados com dados obtidos de maneira ilícita ou ilegítima pela contratante posteriormente, isso pode implicar em uma ilicitude do tratamento, tanto do ponto de vista da Lei Geral de Proteção de Dados ("LGPD", Lei n. 13709/2018) quanto de outras normas.
Após a verificação de que a origem dos dados é legítima e que sua fonte é lícita, passa-se a analisar outros aspectos para determinar a licitude da atividade de checagem de antecedentes.
4. Finalidade de uso dos dados
—
O segundo passo para saber se a atividade é lícita e/ou de alto risco ou não, é a análise da finalidade para qual aquele dado será utilizado.
Por exemplo, determinadas finalidades de uso, como aquelas em relação a recrutamento, seleção ou realizar checagem em pessoas já contratadas, possuem limitações indicadas em normas e jurisprudência. Para outras finalidades, não necessariamente essas limitações se aplicarão. Por isso, é muito importante que, antes de realizar a consulta processual, já se tenha ciência mínima dos casos de uso nas quais elas se aplicarão. É fundamental que se saiba responder quais os propósitos específicos que irão nortear o tratamento.
Quando se determina a finalidade é mais fácil identificar se esta é vedada ou não pela jurisprudência e pela legislação. Quanto mais específica é a finalidade, mais fácil é a identificação de sua licitude ou não. Por exemplo: consulta processual para recrutamento de trabalhadores que trabalham com substâncias tóxicas - esse caso é expressamente autorizado pela jurisprudência (IRR 01 do TST).
5. Dados pertinentes para a análise
—
Ou seja: Sempre será necessário avaliar o contexto que enseja a necessidade da análise de dados processuais e ligá-lo com o caso específico.
Um dos princípios mais importantes da LGPD é o da necessidade (LGPD, art. 6o, III), pelo qual deve-se utilizar apenas os dados que serão estritamente necessários para aquele tratamento como forma de alcançar sua finalidade. Por isso, deve-se considerar os dados pertinentes à atividade, que são proporcionais e não excessivos para atingir os objetivos da consulta.
Em outras palavras, antes de realizar a análise, deve-se entender, minimamente, qual espectro/escopo dos dados seriam pertinentes para ela. Por ex, no caso de dados processuais, para determinadas análises, seria realmente pertinente receber dados referentes a processos de direito ao consumidor? Ou essa medida poderia ser excessiva e não proporcional?
Ainda, conforme indicamos anteriormente, finalidades e situações específicas demandam diferentes análises e desenhos de consulta. Pode ser que, em um contexto, utilizar informações relacionadas a processos civis seja aceitável.
Por exemplo, há casos em que a lei determina que sejam feitas certas pesquisas de antecedentes para alguns cargos, como a Lei 14.811/24, que fala especificamente da necessidade de manutenção de documentação com antecedentes criminais para alguns profissionais em instituições de ensino que irão lidar com menores de idade. Em outro caso, temos a previsão explícita da restrição de uso de certos dados. Por exemplo,, no julgamento do caso do Recurso Ordinário no Processo do Trabalho n. 0000241-06.2013.5.04.0802, determinou-se que, em atividades de contratação de motoristas de carga, é considerado discriminatório a pesquisa, utilização, armazenamento ou mesmo o repasse de informações negativas sobre motoristas baseadas em cadastros de crédito, cadastros referentes a processos civis, inquéritos policiais e processos criminais sem sentença transitada em julgado.
6. Algumas orientações para finalidades específicas
—
Consulta para atividades de recrutamento
TLDR: A justiça já determinou que é discriminatória e abusiva a conduta de fazer análise de histórico processual e checagem de maneira genérica. Em outras palavras, pela justiça, é potencialmente infringente a prática de fazer checagem para qualquer caso de contratação, sem uma análise prévia. Por exemplo, é potencialmente ilegal a prática de fazer checagem de um departamento inteiro de uma empresa, a não ser que haja fortes motivos para tal (ex. o departamento todo lida com transações financeiras sensíveis). Dessa forma, deve-se entender bem qual o público alvo e elencar motivos que justifiquem tal ação. Assim, deve-se entender quais os casos específicos que são permitidos pelas normas (ex. avaliar posições de confiança e pessoas lidem com bens de alto valor). Além disso, sempre vale checar se
Neste tópico, falaremos brevemente de entendimentos consolidados sobre atividades de recrutamento.
Mais especificamente, é importante:
Verificar se a checagem é uma hipótese autorizada pela legislação e jurisprudência
Verificar se os dados a serem analisados são pertinentes para o tipo de avaliação que será realizada, em concordância com o princípio da necessidade da LGPD.
Por exemplo, por vezes, uma pessoa pode ter processos relativos a direito do consumidor. Tais dados geralmente não são pertinentes para uma análise relativa a uma pessoa que ocupa ou potencialmente ocupará posição de confiança em uma empresa. A LGPD estabelece, através do princípio da necessidade, que dados que não são necessários para a análise devem ser descartados. Por essa razão, é importante que a empresa tenha pelo menos algumas diretrizes relativas aos dados que são pertinentes para cada uma de suas análises - sempre levando em consideração o caso concreto.
Além de ser contrário ao princípio da necessidade previsto na LGPD, a análise de dados não pertinentes para uma avaliação pode atrasar esse processo e oferecer resultados que não sejam tão úteis para o avaliador.
Entender quais são as hipóteses autorizativas da LGPD que autorizam o tratamento, independente de se tratarem de dados públicos ou não.
Realizar uma análise de risco relativa do ponto de vista de enquadramento à LGPD e entender se há necessidade de documentos adicionais, como teste de legítimo interesse, dentre outros.
Informar ao candidato e/ou funcionário que, eventualmente, poderá consultar outras fontes informacionais sobre ele que estejam relacionadas ao exercício de sua função
O que a lei não recomenda realizar (tanto para processos seletivos quanto para avaliação de funcionários já contratados)
Realizar a busca de processos trabalhistas, visto que configura a montagem de lista suja
ex. Verificar se a pessoa já processou outra empresa onde trabalhou.
Realizar busca de processos criminais de maneira generalizada e sem nenhuma ressalva/limites para qualquer tipo de posição:
Conforme colocamos anteriormente, não é recomendado que se faça busca de informações criminais de maneira generalizadas para funcionários no geral. Isso significa que cada vaga/função vai demandar uma justificativa diferente para a realização ou não de consulta processual.
Ter como base da análise processos em andamentos/boletins de ocorrência. Isso é proibido expressamente pela decisão do TST.
Consulta de Antecedentes Criminais
No caso da checagem de antecedentes realizada para fins de recrutamento, o principal parâmetro que temos atualmente consiste no julgamento do Incidente de Recurso Repetitivo de Tema nº 01 (ou processo nº 243000-58.2013.5.13.0023) pelo Tribunal Superior do Trabalho ("TST"). Nessa decisão, o TST avaliou a possibilidade de o empregador solicitar certidão de antecedentes criminais durante o processo seletivo e decidiu que essa exigência seria justificada apenas em situações excepcionais, como: (i) quando a lei prevê; (ii) pela natureza do ofício; e/ou (iii) grau de fidúcia da atividade a ser desenvolvida.
Assim, deve-se entender se as funções a serem analisadas possuem algum desses elementos e como eles se relacionam, de maneira a justificar a pertinência da realização desse tipo de operação.
Em decisão mais recente (RRAg - 318-54.2013.5.04.0013), o TST entendeu que, mesmo que sejam fornecidas somente informações de processos criminais, é preciso exibir somente aqueles que poderiam impactar a atividade a ser prestada. Fornecer outras informações, inclusive relacionadas a outros tipos de processos judiciais, configura conduta discriminatória que restringe o acesso ao mercado de trabalho.
Trazemos abaixo alguns exemplos de funções nas quais há certa passividade sobre a possibilidade de realização busca de antecedentes criminais:
Empregados domésticos;
Cuidadores de menores, idosos ou deficientes;
Motoristas rodoviários de carga;
Empregados que laboram no setor da agroindústria no manejo de ferramentas de trabalho perfurocortantes; Bancários e afins;
Trabalhadores que atuam com substâncias tóxicas, entorpecentes
e armas;Trabalhadores que atuam com informações sigilosas;
Pessoas em cargo de confiança e que lidarão com alto risco;
Pessoas que tenham que ter porte de armas.
Pessoas que trabalham com menores de idade em instituições de ensino (Lei 14.811/24)
Outros casos:
Serviços financeiros digitais: Lei da Lavagem de Dinheiro (nº 9.613/98), que determina as organizações reguladas a identificarem seus clientes e manterem esse cadastro sempre atualizado, assim como o registro de todas as transações realizadas em moeda nacional ou estrangeira. Dessa forma, funções que estejam implicadas na legislação podem
ser afetadas.Serviços de delivery: motoboys e mototaxistas, por exemplo, são regulamentados pela Lei nº 12.009/09, que exige que pessoas nessa função tenham 21 anos completos. Além disso, o artigo 147 do Código de Trânsito Brasileiro determina que os candidatos devem aplicar aos exames oferecidos pelo órgão executivo de trânsito brasileiro.
Exemplos de leis que permitem checagem
Abaixo, trazemos abaixo alguns exemplos de legislações que permitem a realização de certos tipos de checagem. A lista não é exaustiva. É interessante, antes de utilizar dados públicos, entender se há legislações específicas que exigem e/ou encorajam determinados tipos de estudo.
Lei nº 14.811/24: Muda a redação do ECA para que determinar a manutenção de certidões criminais para seus colaboradores, especialmente aqueles que lidam com menores de idade.
Instituições sociais públicas ou privadas (com recursos públicos): Devem exigir e atualizar certidões a cada 6 meses.
Estabelecimentos educacionais (públicos ou privados): Devem manter fichas cadastrais e certidões atualizadas, independentemente de receberem recursos públicos.
Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97): O art. 329 determina a checagem de antecedentes criminais de motoristas de veículos de aluguel e escolares. Os condutores, para exercerem suas atividades, deverão apresentar, previamente, certidão negativa do registro de distribuição criminal relativamente aos crimes de homicídio, roubo, estupro e corrupção de menores, renovável a cada cinco anos, junto ao órgão responsável pela respectiva concessão ou autorização
Lei nº 14.967/24: Determina a verificação de antecedentes criminais de vigilantes e prestadores de serviço de segurança privada, assim como antecedentes civis e criminais para responsáveis pela prestação de serviço de segurança privada.
Lei nº 12.009/09: determina a verificação de antecedentes criminais de motoboys e mototaxistas.
Lei nº 12.587/12: determina a verificação de antecedentes criminais de motoristas de aplicativo.
7. Por que esse cuidado?
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O Jusbrasil Soluções não se responsabiliza pela realização da análise concreta de cada caso sobre a necessidade de consulta processual na tomada de decisão do cliente. No entanto, há decisões que implicam todos os agentes na cadeia de tratamento por responsabilidade em caso de tratamento indevido. pelo fornecimento de dados para a pesquisa também estaria incorrendo em uma infração.
Por essa razão, o Jusbrasil Soluções oferece informações e contextualização sobre os casos que necessitam de mitigação.
De modo geral, o entendimento que temos é de que a checagem de antecedentes durante processo seletivo só é legítima e compatível com a legislação quando sua finalidade estiver relacionada a obrigação legal (ex: contratação de motoboys²), ao tipo de trabalho a ser executado ou a um elevado grau de cuidado a ser considerado na contratação (ex: motoristas de cargas).
Lembramos ainda que, a depender do contexto e da forma que é realizada, a checagem de antecedentes pode consistir em conduta discriminatória.
Lei nº 9.029/1995 (art. 1º): estabelece que são vedadas práticas discriminatórias e limitativas ao acesso ao trabalho que sejam baseadas em sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros.
Lei nº 9.799/1999: altera o art. 373A da CLT para que conste a vedação à consideração de sexo, idade, cor ou situação familiar como variável determinante para fins de remuneração, formação profissional e oportunidades de ascensão profissional, bem como à adoção de critérios subjetivos para deferimento de inscrição ou aprovação em concursos, em empresas privadas, em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez.
LGPD: evidencia a preocupação com a utilização de dados pessoais para fins discriminatórios ao estabelecer, em seu art. 6º, como um dos princípios que devem ser observados nas atividades de tratamento de dados pessoais a não discriminação, sendo afastada a possibilidade de realização do tratamento para fins discriminatórios ilícitos ou abusivos.
² No art. 2º da Lei nº 12.009/2009: estabelece que, para o exercício das profissões de motoboy e mototaxista, será necessário apresentar certidão negativa das varas criminais, além de outros documentos de identificação da pessoa e da motocicleta utilizada em serviço e de comprovação da habilitação para exercício da atividade.
8. Medidas de transparência
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É importante que os funcionários/candidatos/titulares de dados no geral estejam cientes pelo menos da possibilidade de realização de checagem de antecedentes. A forma e o momento em que isso é comunicado, assim como o teor da comunicação, é de responsabilidade da empresa e não do Jusbrasil Soluções.
9. Medidas de adequação à LGPD
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A empresa é responsável por determinar as finalidades e bases legais que justificam essa atividade. Ainda, a empresa precisa entender se há algum documento específico que precisa produzir (por ex. Relatório de Impacto) e realizá-lo. Nos contratos firmados entre as partes (Jusbrasil Soluções e empresas), há cláusulas nas quais os clientes se comprometem a garantir que estão adequados à LGPD e que tomam todas as medidas necessárias para a mitigação dos riscos.
Importante mencionar que, nos contratos, a contratada se compromete em estar adequada à LGPD e obedecer às suas determinações.
Publicado em 14/05/2025
1. Introdução e uso dos dados com responsabilidade
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Para além dos parâmetros contratuais, é importante que cada entidade que utilize algum produto de Jusbrasil Soluções adote boas práticas nos usos dos dados. Apesar da maior parte dos produtos trabalharem com dados públicos, atualmente há algumas diretrizes que devem ser seguidas nesse tratamento para que ele continue sendo lícito e responsável. Como sabemos que é um assunto complexo, esse guia foi elaborado com base nas melhores práticas nacionais e internacionais, indicando alguns parâmetros e recomendações que devem ser adaptadas pelos clientes do Jusbrasil Soluções, a depender de seu contexto.
A definição de tais parâmetros levou em consideração normas setoriais, decisões judiciais (sendo que alguns julgamentos ainda estão em curso) e decisões de autoridades nacionais de proteção de dados de autoridades estrangeiras¹.
A partir do momento em que o dado é disponibilizado aos clientes, o Jusbrasil Soluções não se responsabiliza por qualquer ação do cliente, inclusive aquelas que possam estar em descompasso com o previsto no nesse guia. Quaisquer responsabilidades em decorrência do uso em descompasso ou de maneira diferente daquilo que é previsto no contrato é de responsabilidade integral do cliente.
Por essa razão, esse guia irá passar sobre alguns dos principais pontos de preocupação que qualquer organização pode ter ao tratar de dados pessoais que também são dados disponíveis publicamente. Mais uma vez, ressaltamos que cada organização deve levar em consideração o seu próprio contexto, e adaptar esse essas sugestões a sua realidade.
¹ Por que olhamos para autoridades estrangeiras? No Brasil, temos a Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) que é a responsável por regulamentar aspectos deixados em aberto pela Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Como a LGPD é muito baseada na Regulamentação Geral de Proteção de Dados, da União Europeia (UE), a ANPD tem utilizado muitos documentos de autoridades nacionais europeias como base para algumas de suas decisões.
2. Resumo dos tópicos a serem abordados
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Tópicos para boas práticas e parâmetros de uso
Qual é a origem dos dados?
Qual a finalidade da análise?
Quais tipos de dados são pertinentes para a análise? (Por ex. saber se a pessoa possui processos relativos a relações de consumo é relevante?)
Algumas orientações para finalidades específicas
Medidas de transparência
Medidas de adequação à LGPD
3. Origem dos dados
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TLDR: Uma operação que se utilize de dados cuja origem é ilícita, por mais que também utilize outras fontes lícitas, correrá o risco de realizar atividades fora dos parâmetros da lei.
Começamos por uma avaliação que deve ser feita primordialmente, antes da integração de qualquer base de dados a um sistema, que é sobre a origem daqueles dados. Deve haver cuidado na escolha dos dados em relação a sua origem, de maneira a garantir, desde o princípio do tratamento, sua licitude. Por exemplo, nos últimos anos, houve inúmeros vazamentos ilegais de diversas bases de dados, que foram apropriadas por entidades e organizações diversas. A compra/obtenção desses dados é considerada ilícita.
Quando falamos de dados disponíveis publicamente de maneira legítima, também deve haver cuidados. Por exemplo, informações em segredo de justiça são consideradas sigilosas pela própria Constituição Federal e normas infralegais, de forma que sua utilização, em princípio, por partes não interessadas e pessoas não autorizadas pode ser objeto de reparação judicial. Por essa razão, há um cuidado muito grande nos dados que estão disponíveis no Jusbrasil Soluções e, em alguns casos, não há a possibilidade de disponibilização de certos tipos de informações e bases de dados.
Ainda, apesar da licitude dos dados disponibilizados no Jusbrasil Soluções, se eles forem combinados com dados obtidos de maneira ilícita ou ilegítima pela contratante posteriormente, isso pode implicar em uma ilicitude do tratamento, tanto do ponto de vista da Lei Geral de Proteção de Dados ("LGPD", Lei n. 13709/2018) quanto de outras normas.
Após a verificação de que a origem dos dados é legítima e que sua fonte é lícita, passa-se a analisar outros aspectos para determinar a licitude da atividade de checagem de antecedentes.
4. Finalidade de uso dos dados
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O segundo passo para saber se a atividade é lícita e/ou de alto risco ou não, é a análise da finalidade para qual aquele dado será utilizado.
Por exemplo, determinadas finalidades de uso, como aquelas em relação a recrutamento, seleção ou realizar checagem em pessoas já contratadas, possuem limitações indicadas em normas e jurisprudência. Para outras finalidades, não necessariamente essas limitações se aplicarão. Por isso, é muito importante que, antes de realizar a consulta processual, já se tenha ciência mínima dos casos de uso nas quais elas se aplicarão. É fundamental que se saiba responder quais os propósitos específicos que irão nortear o tratamento.
Quando se determina a finalidade é mais fácil identificar se esta é vedada ou não pela jurisprudência e pela legislação. Quanto mais específica é a finalidade, mais fácil é a identificação de sua licitude ou não. Por exemplo: consulta processual para recrutamento de trabalhadores que trabalham com substâncias tóxicas - esse caso é expressamente autorizado pela jurisprudência (IRR 01 do TST).
5. Dados pertinentes para a análise
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Ou seja: Sempre será necessário avaliar o contexto que enseja a necessidade da análise de dados processuais e ligá-lo com o caso específico.
Um dos princípios mais importantes da LGPD é o da necessidade (LGPD, art. 6o, III), pelo qual deve-se utilizar apenas os dados que serão estritamente necessários para aquele tratamento como forma de alcançar sua finalidade. Por isso, deve-se considerar os dados pertinentes à atividade, que são proporcionais e não excessivos para atingir os objetivos da consulta.
Em outras palavras, antes de realizar a análise, deve-se entender, minimamente, qual espectro/escopo dos dados seriam pertinentes para ela. Por ex, no caso de dados processuais, para determinadas análises, seria realmente pertinente receber dados referentes a processos de direito ao consumidor? Ou essa medida poderia ser excessiva e não proporcional?
Ainda, conforme indicamos anteriormente, finalidades e situações específicas demandam diferentes análises e desenhos de consulta. Pode ser que, em um contexto, utilizar informações relacionadas a processos civis seja aceitável.
Por exemplo, há casos em que a lei determina que sejam feitas certas pesquisas de antecedentes para alguns cargos, como a Lei 14.811/24, que fala especificamente da necessidade de manutenção de documentação com antecedentes criminais para alguns profissionais em instituições de ensino que irão lidar com menores de idade. Em outro caso, temos a previsão explícita da restrição de uso de certos dados. Por exemplo,, no julgamento do caso do Recurso Ordinário no Processo do Trabalho n. 0000241-06.2013.5.04.0802, determinou-se que, em atividades de contratação de motoristas de carga, é considerado discriminatório a pesquisa, utilização, armazenamento ou mesmo o repasse de informações negativas sobre motoristas baseadas em cadastros de crédito, cadastros referentes a processos civis, inquéritos policiais e processos criminais sem sentença transitada em julgado.
6. Algumas orientações para finalidades específicas
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Consulta para atividades de recrutamento
TLDR: A justiça já determinou que é discriminatória e abusiva a conduta de fazer análise de histórico processual e checagem de maneira genérica. Em outras palavras, pela justiça, é potencialmente infringente a prática de fazer checagem para qualquer caso de contratação, sem uma análise prévia. Por exemplo, é potencialmente ilegal a prática de fazer checagem de um departamento inteiro de uma empresa, a não ser que haja fortes motivos para tal (ex. o departamento todo lida com transações financeiras sensíveis). Dessa forma, deve-se entender bem qual o público alvo e elencar motivos que justifiquem tal ação. Assim, deve-se entender quais os casos específicos que são permitidos pelas normas (ex. avaliar posições de confiança e pessoas lidem com bens de alto valor). Além disso, sempre vale checar se
Neste tópico, falaremos brevemente de entendimentos consolidados sobre atividades de recrutamento.
Mais especificamente, é importante:
Verificar se a checagem é uma hipótese autorizada pela legislação e jurisprudência
Verificar se os dados a serem analisados são pertinentes para o tipo de avaliação que será realizada, em concordância com o princípio da necessidade da LGPD.
Por exemplo, por vezes, uma pessoa pode ter processos relativos a direito do consumidor. Tais dados geralmente não são pertinentes para uma análise relativa a uma pessoa que ocupa ou potencialmente ocupará posição de confiança em uma empresa. A LGPD estabelece, através do princípio da necessidade, que dados que não são necessários para a análise devem ser descartados. Por essa razão, é importante que a empresa tenha pelo menos algumas diretrizes relativas aos dados que são pertinentes para cada uma de suas análises - sempre levando em consideração o caso concreto.
Além de ser contrário ao princípio da necessidade previsto na LGPD, a análise de dados não pertinentes para uma avaliação pode atrasar esse processo e oferecer resultados que não sejam tão úteis para o avaliador.
Entender quais são as hipóteses autorizativas da LGPD que autorizam o tratamento, independente de se tratarem de dados públicos ou não.
Realizar uma análise de risco relativa do ponto de vista de enquadramento à LGPD e entender se há necessidade de documentos adicionais, como teste de legítimo interesse, dentre outros.
Informar ao candidato e/ou funcionário que, eventualmente, poderá consultar outras fontes informacionais sobre ele que estejam relacionadas ao exercício de sua função
O que a lei não recomenda realizar (tanto para processos seletivos quanto para avaliação de funcionários já contratados)
Realizar a busca de processos trabalhistas, visto que configura a montagem de lista suja
ex. Verificar se a pessoa já processou outra empresa onde trabalhou.
Realizar busca de processos criminais de maneira generalizada e sem nenhuma ressalva/limites para qualquer tipo de posição:
Conforme colocamos anteriormente, não é recomendado que se faça busca de informações criminais de maneira generalizadas para funcionários no geral. Isso significa que cada vaga/função vai demandar uma justificativa diferente para a realização ou não de consulta processual.
Ter como base da análise processos em andamentos/boletins de ocorrência. Isso é proibido expressamente pela decisão do TST.
Consulta de Antecedentes Criminais
No caso da checagem de antecedentes realizada para fins de recrutamento, o principal parâmetro que temos atualmente consiste no julgamento do Incidente de Recurso Repetitivo de Tema nº 01 (ou processo nº 243000-58.2013.5.13.0023) pelo Tribunal Superior do Trabalho ("TST"). Nessa decisão, o TST avaliou a possibilidade de o empregador solicitar certidão de antecedentes criminais durante o processo seletivo e decidiu que essa exigência seria justificada apenas em situações excepcionais, como: (i) quando a lei prevê; (ii) pela natureza do ofício; e/ou (iii) grau de fidúcia da atividade a ser desenvolvida.
Assim, deve-se entender se as funções a serem analisadas possuem algum desses elementos e como eles se relacionam, de maneira a justificar a pertinência da realização desse tipo de operação.
Em decisão mais recente (RRAg - 318-54.2013.5.04.0013), o TST entendeu que, mesmo que sejam fornecidas somente informações de processos criminais, é preciso exibir somente aqueles que poderiam impactar a atividade a ser prestada. Fornecer outras informações, inclusive relacionadas a outros tipos de processos judiciais, configura conduta discriminatória que restringe o acesso ao mercado de trabalho.
Trazemos abaixo alguns exemplos de funções nas quais há certa passividade sobre a possibilidade de realização busca de antecedentes criminais:
Empregados domésticos;
Cuidadores de menores, idosos ou deficientes;
Motoristas rodoviários de carga;
Empregados que laboram no setor da agroindústria no manejo de ferramentas de trabalho perfurocortantes; Bancários e afins;
Trabalhadores que atuam com substâncias tóxicas, entorpecentes
e armas;Trabalhadores que atuam com informações sigilosas;
Pessoas em cargo de confiança e que lidarão com alto risco;
Pessoas que tenham que ter porte de armas.
Pessoas que trabalham com menores de idade em instituições de ensino (Lei 14.811/24)
Outros casos:
Serviços financeiros digitais: Lei da Lavagem de Dinheiro (nº 9.613/98), que determina as organizações reguladas a identificarem seus clientes e manterem esse cadastro sempre atualizado, assim como o registro de todas as transações realizadas em moeda nacional ou estrangeira. Dessa forma, funções que estejam implicadas na legislação podem
ser afetadas.Serviços de delivery: motoboys e mototaxistas, por exemplo, são regulamentados pela Lei nº 12.009/09, que exige que pessoas nessa função tenham 21 anos completos. Além disso, o artigo 147 do Código de Trânsito Brasileiro determina que os candidatos devem aplicar aos exames oferecidos pelo órgão executivo de trânsito brasileiro.
Exemplos de leis que permitem checagem
Abaixo, trazemos abaixo alguns exemplos de legislações que permitem a realização de certos tipos de checagem. A lista não é exaustiva. É interessante, antes de utilizar dados públicos, entender se há legislações específicas que exigem e/ou encorajam determinados tipos de estudo.
Lei nº 14.811/24: Muda a redação do ECA para que determinar a manutenção de certidões criminais para seus colaboradores, especialmente aqueles que lidam com menores de idade.
Instituições sociais públicas ou privadas (com recursos públicos): Devem exigir e atualizar certidões a cada 6 meses.
Estabelecimentos educacionais (públicos ou privados): Devem manter fichas cadastrais e certidões atualizadas, independentemente de receberem recursos públicos.
Código de Trânsito Brasileiro (Lei nº 9.503/97): O art. 329 determina a checagem de antecedentes criminais de motoristas de veículos de aluguel e escolares. Os condutores, para exercerem suas atividades, deverão apresentar, previamente, certidão negativa do registro de distribuição criminal relativamente aos crimes de homicídio, roubo, estupro e corrupção de menores, renovável a cada cinco anos, junto ao órgão responsável pela respectiva concessão ou autorização
Lei nº 14.967/24: Determina a verificação de antecedentes criminais de vigilantes e prestadores de serviço de segurança privada, assim como antecedentes civis e criminais para responsáveis pela prestação de serviço de segurança privada.
Lei nº 12.009/09: determina a verificação de antecedentes criminais de motoboys e mototaxistas.
Lei nº 12.587/12: determina a verificação de antecedentes criminais de motoristas de aplicativo.
7. Por que esse cuidado?
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O Jusbrasil Soluções não se responsabiliza pela realização da análise concreta de cada caso sobre a necessidade de consulta processual na tomada de decisão do cliente. No entanto, há decisões que implicam todos os agentes na cadeia de tratamento por responsabilidade em caso de tratamento indevido. pelo fornecimento de dados para a pesquisa também estaria incorrendo em uma infração.
Por essa razão, o Jusbrasil Soluções oferece informações e contextualização sobre os casos que necessitam de mitigação.
De modo geral, o entendimento que temos é de que a checagem de antecedentes durante processo seletivo só é legítima e compatível com a legislação quando sua finalidade estiver relacionada a obrigação legal (ex: contratação de motoboys²), ao tipo de trabalho a ser executado ou a um elevado grau de cuidado a ser considerado na contratação (ex: motoristas de cargas).
Lembramos ainda que, a depender do contexto e da forma que é realizada, a checagem de antecedentes pode consistir em conduta discriminatória.
Lei nº 9.029/1995 (art. 1º): estabelece que são vedadas práticas discriminatórias e limitativas ao acesso ao trabalho que sejam baseadas em sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros.
Lei nº 9.799/1999: altera o art. 373A da CLT para que conste a vedação à consideração de sexo, idade, cor ou situação familiar como variável determinante para fins de remuneração, formação profissional e oportunidades de ascensão profissional, bem como à adoção de critérios subjetivos para deferimento de inscrição ou aprovação em concursos, em empresas privadas, em razão de sexo, idade, cor, situação familiar ou estado de gravidez.
LGPD: evidencia a preocupação com a utilização de dados pessoais para fins discriminatórios ao estabelecer, em seu art. 6º, como um dos princípios que devem ser observados nas atividades de tratamento de dados pessoais a não discriminação, sendo afastada a possibilidade de realização do tratamento para fins discriminatórios ilícitos ou abusivos.
² No art. 2º da Lei nº 12.009/2009: estabelece que, para o exercício das profissões de motoboy e mototaxista, será necessário apresentar certidão negativa das varas criminais, além de outros documentos de identificação da pessoa e da motocicleta utilizada em serviço e de comprovação da habilitação para exercício da atividade.
8. Medidas de transparência
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É importante que os funcionários/candidatos/titulares de dados no geral estejam cientes pelo menos da possibilidade de realização de checagem de antecedentes. A forma e o momento em que isso é comunicado, assim como o teor da comunicação, é de responsabilidade da empresa e não do Jusbrasil Soluções.
9. Medidas de adequação à LGPD
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A empresa é responsável por determinar as finalidades e bases legais que justificam essa atividade. Ainda, a empresa precisa entender se há algum documento específico que precisa produzir (por ex. Relatório de Impacto) e realizá-lo. Nos contratos firmados entre as partes (Jusbrasil Soluções e empresas), há cláusulas nas quais os clientes se comprometem a garantir que estão adequados à LGPD e que tomam todas as medidas necessárias para a mitigação dos riscos.
Importante mencionar que, nos contratos, a contratada se compromete em estar adequada à LGPD e obedecer às suas determinações.